Em 1989, Kaës(1989;2015) formula o conceito de pacto denegativo para descrever uma aliança inconsciente ou, como ele dirá em 2015, o protótipo das alianças inconscientes defensivas. Pacto denegativo “qualifica um acordo inconsciente imposto ou concluído mutuamente entre sujeitos para que o vínculo que eles contratam se organize e se mantenha na complementaridade dos interesses de cada sujeito.”(Kaës,2015, p.202) O pacto funda-se sobre diversas operações psíquicas – conjuntas e correlativas – “de recalque, de denegação ou de negação, de desmentido, de recusa ou de enquistamento”.( Kaës,2015, p.202)
A formulação inicial desse conceito será mais tarde, em 1993, completada com a discussão sobre as duas polaridades do pacto denegativo; uma delas, define-a como organizadora do vínculo e do espaço intrapsíquico na complementaridade dos interesses inconscientes dos membros envolvidos; a outra polaridade é patógena e cria no conjunto e nos sujeitos do vínculo, zonas de silencio e de restos não significáveis como bolsas de intoxicação que “ mantêm os sujeitos de um vínculo estranhos a sua própria história e à história dos outros membros.” (KAËS, 1993, p.274; 2015,p.202)
Esse conceito anuncia a maneira através da qual o autor busca ampliar a compreensão da realidade psíquica inconsciente compartilhada na constituição do vínculo. As pessoas se vinculam entre si e nos conjuntos por diversas formas de identificação, pelas ressonâncias fantasmáticas, pelos investimentos pulsionais convergentes ou contrários, pelos complexos que fazem as matrizes dos vínculos entre seus objetos internos, pelos representantes e pelos significantes que lhes são comuns ((KAËS, 1993). Contudo, reafirma o autor, os sujeitos de um vínculo devem ainda enlaçar-se e selar entre eles as alianças, algumas conscientes; outras inconscientes.
O conceito de pacto denegativo e o de alianças inconscientes, categoria na qual o pacto se insere, inscrevem-se no conjunto das investigações sobre os processos e as formações psíquicas específicas dos conjuntos, na proposta da construção de uma metapsicologia de terceiro tipo. Elas atestam a hipótese, levada a cabo nas pesquisas sobre os grupos e o aparelho psíquico grupal, de um Inconsciente politópico, inscrito e ativo nos vários espaços psíquicos. Sua função principal é a de manter e reforçar seu vínculo, de definir as questões e os termos, e de instalá-lo ao longo do tempo, torná-lo duradouro. Assim, as alianças não se constituem somente em nível sincrônico, ou seja, aquelas que contraímos com nossos contemporâneos. Há as alianças diacrônicas, que “são contratadas por nós e sem nós, antes de nosso nascimento; nós as herdamos e, como tal, são um processo principal da transmissão psíquica dos movimentos de vida e de morte entre as gerações” (KAËS,2015, p.200).
As pessoas se vinculam entre si e nos conjuntos por diversas formas de identificação, pelas ressonâncias fantasmáticas, pelos investimentos pulsionais convergentes ou contrários, pelos complexos que fazem as matrizes dos vínculos entre seus objetos internos, pelos representantes e pelos significantes que lhes são comuns
O autor propôs “chamar alianças inconscientes formações psíquicas comuns e partilhadas que se enlaçam na conjunção das relações inconscientes que mantêm os sujeitos de um vínculo entre eles e com o conjunto ao qual estão ligados, ao serem parte interessada e parte constituinte” (KAËS, 2009, p.35). Elas são inconscientes posto que estão submetidas aos processos constitutivos do inconsciente e estão sob o efeito dos dois grandes tipos de operações de defesa que o constituem: as operações de defesa por recalque, em suas formas originárias e secundárias; além daquelas que procedem da negação (ou recusa) e da rejeição (ou forclusão) (KAËS, 2009).
Hipótese do Inconsciente no Grupo
Na proposição de uma concepção politópica do inconsciente, Kaës afirma que o “espaço intrapsíquico individual não é mais concebido como o lugar exclusivo do inconsciente (…) A ideia de uma tópica deslocalizada, intersubjetiva, tinha sido introduzida por Freud a partir do momento em que a questão da transmissão psíquica colocava-se não somente na escala de muitas gerações como também na sincronia dos sujeitos que formam o casal, a família ou o grupo” (KAËS, 1993, p.254).
Essas aberturas, na obra freudiana, em relação à deslocalização da tópica individual do inconsciente, são parte da elaboração da segunda teoria do aparelho psíquico embora já estivessem em gestação a partir de seu artigo sobre O Inconsciente, de 1915. Segundo Kaës, a partir daí teríamos uma teoria ampliada do inconsciente que dá lugar à questão do originário e uma teoria restrita do inconsciente que diz respeito à questão da transmissão (KAËS, 1993). “Essas duas aberturas exploram o eixo diacrônico da formação do inconsciente. O método grupal e a abordagem grupal do psiquismo exploram, mais precisamente, o eixo sincrônico” (Kaës, 1993.p. 255). Nessa perspectiva de constituição de outra metapsicologia, à qual o autor nomeava como metapsicologia intersubjetiva, a investigação grupal sobre a constituição psíquica e as formações do inconsciente, ganham força. Será, portanto, nesse eixo de pesquisa que se construirá a hipótese de uma função co-recalcante em nível do grupo e a produção grupal de um recalque.
Nessa investigação, ao mesmo tempo em que reafirma que o recalque é individual, em seu mais alto grau, Kaës propõe considerar as condições intersubjetivas nas quais ele se constitui. E, ao acentuar as condições intersubjetivas, considera a hipótese segundo a qual certas modalidades do recalque estão em operação nas alianças inconscientes, nos pactos denegativos e nos contratos narcísicos. Os dados da clínica e dos processos associativos nos grupos, ainda lhe permitem supor a existência de modalidades do retorno do recalcado como tributárias da economia, da lógica e da tópica grupais.
A proposta de construção de uma nova metapsicologia intersubjetiva teria como objetivo a articulação das relações entre o duplo limite constitutivo do espaço psíquico, descrito por A. Green: o limite intrapsíquico entre o Inconsciente e o Pré-Consciente/Consciente e o limite interpsíquico entre Self e o não-Self. (KAËS, 1993, p.255). Segundo o autor, o problema é dar conta desses dois fatos uma vez que esses dois limites se cruzam dentro e fora de cada sujeito e que a textura psíquica da intersubjetividade é a condição do sujeito do inconsciente. Nesse debate, coloca-se em ação a construção de uma terceira tópica que desde 1970, ao formular o modelo do aparelho psíquico grupal, já se constituía como necessidade, para o autor; e, viria a se tornar mais precisa e formatada em 2008, através da publicação de Pour une troisième topique de l’intersubjectivité et du sujet dans l’espace commum et partagé (KAËS, 2015). A metapsicologia de terceiro tipo, como é atualmente nomeada, conserva todos os objetivos do que se desenvolveu na terceira tópica embora lhe atribua outra dimensão ao incluir os pontos de vista dinâmico e econômico.
Essa proposição sustenta-se no postulado de que as formações e processos em operação (atividade) nos vínculos intersubjetivos são tributários do mesmo inconsciente enquanto objeto teórico da psicanálise. Contudo, não são as mesmas formações nem os mesmos processos que se manifestam no dispositivo clássico da psicanálise, referido ao sujeito singular. Trata-se de manter a unidade epistêmica do inconsciente e de trabalhar suas formações e seus processos no quadro dos arranjos específicos em que ele se manifesta. Assim, o grupo seria um dos lugares de manifestação do inconsciente. Fala-se, portanto, do Inconsciente em sua modalidade grupal de manifestação e as alianças inconscientes expressam a especificidade dessa realidade psíquica.
A análise dessa realidade psíquica permite a formulação de três hipóteses sobre o grupo. A primeira, considera o grupo como lugar de manifestação do inconsciente; a segunda, considera o grupo como lugar de trabalho do inconsciente; e, a terceira, avalia o grupo como lugar de produção do inconsciente (KAËS, 1993, p.257; 1994; 2005; 2015). O conceito de sujeito do grupo, em Kaës, apoia-se na consideração dessas três hipóteses e, portanto, diz respeito ao sujeito do inconsciente como sujeito do grupo, do vínculo.
Tais hipóteses sustentam que o inconsciente – a realidade psíquica “não coincide estritamente nos seus processos de formação, nos seus conteúdos e nas suas manifestações, com os limites e a lógica interna do aparelho psíquico do sujeito considerado isoladamente” (Käes, 1993, p. 98). A realidade psíquica não coincide com o espaço individual e seu apoio corporal e, como consequência, exige recuperar o valor epistemológico do conceito de apoio, nas suas três dimensões – suporte, modelo e retomada derivante (Käes, 1993, p. 98).
Realidade Psíquica e Alianças Inconscientes: antecedentes
Freud em O inconsciente (1915), afirma:
“Assim como Kant nos advertiu para não ignorarmos o fato de que nossas percepções são subjetivamente condicionadas e não devem ser tidas como idênticas ao que, embora incognoscível, é percebido, a psicanálise nos adverte a não equacionar as percepções que temos por meio da consciência, com os processos mentais inconscientes que são seu objeto. Como o físico, o psíquico não é necessariamente na realidade, o que nos parece ser (…) (…) os objetos internos são menos incognoscíveis do que o mundo exterior”
(Freud, 1915 [1967]).
Assim, realidade psíquica tal como apresentada por Laplanche/Pontalis (1970), é “a expressão muitas vezes utilizada por Freud para designar aquilo que na psique do indivíduo apresenta uma coerência e uma resistência comparáveis às da realidade material – trata-se do desejo inconsciente e dos fantasmas conexos” (LAPLANCHE, J. PONTALIS, J-B, 2014, p.391)
O percurso de Freud sobre a conceituação do que seja realidade inicia-se em 1895 em Projeto para uma Psicologia Científica, quando trabalha sobre a carga de energia ligada à lembrança do objeto; percorre a construção da etiologia traumática das neuroses; e desenvolve, em 1901, por meio de Psicologia dos processos oníricos, a primeira formulação do conceito de realidade psíquica, sendo o inconsciente a expressão verdadeira dessa realidade. Em 1905 dá continuidade à investigação por meio da discussão entre Fantasia e Realidade e consolida em Totem e Tabu (1913) uma distinção entre realidade psíquica e realidade factual. Procura distinguir os acontecimentos externos, chamados fatos, dos acontecimentos internos, chamados pensamentos e, no trabalho que desenvolve sobre a percepção nos homens primitivos chega a discutir a importância da realidade psíquica nos caminhos tomados pela humanidade (EVA,1998).
A obra O inconsciente (1915) registra seu estudo mais consistente sobre essa questão e em A perda da realidade nas neuroses e psicoses (1925) discute os mecanismos pelos quais a realidade psíquica se separa da realidade externa. “No decorrer da obra freudiana sempre haverá lugar para a ação vinda do exterior como elemento real e para o estudo dos seus efeitos no mundo mental.” (Eva, 1998, p.274). No âmbito dos procedimentos de investigação sobre realidade psíquica os modelos clínicos se constituem e, derivam de suas diversas conceituações. Um primeiro modelo, “toma a realidade externa tal qual é percebida pelos órgãos dos sentidos” (Eva, 1998, p. 284), e pensa a realidade interior constituída pelos desejos inconscientes fantasiados. Seria a interação entre esses dois mundos a criar a realidade psíquica. Nesta, há um afastamento da proposta de Freud em relação a ser o inconsciente a verdadeira realidade psíquica. Esse modelo supõe acesso, portanto, a duas realidades bem como à resultante delas. Um segundo modelo privilegia a realidade externa, tomada como realidade desejável; esse modelo vê a realidade psíquica como distorção da realidade externa. Neste, reconhece-se a clínica psiquiátrica, quando mede o sucesso ou eficácia de um procedimento pela desaparição do sintoma; supõe que o sucesso seja a mudança da realidade psíquica que se igualaria à realidade externa. Um terceiro modelo supõe o modelo subjetivo como único possível de se conhecer. A realidade conhecida é subjetiva. Não há condição de separar ou discriminar o interno do externo. Em todos esses modelos há um limite estabelecido para o que pode movimentar a vida mental, orientado do lado de fora, pelo grupo social – família, por exemplo – e, do lado de dentro pelo grupo interiorizado.
“Quando podemos nos dar conta de que a percepção que temos é resultado de uma modificação que automaticamente executamos sobre o objeto focalizado, dentro ou fora, estamos mais propensos a levar em consideração os espaços que medeiam nossa percepção”
(Eva, 1998, p.284).
Lembremos que Bion contribuiu sobremaneira para a questão da realidade psíquica quando introduziu a questão da realidade do objeto, a qual confrontaria o sujeito a sua ‘verdade absoluta’ a da própria realidade psíquica inconsciente que designa por O. (KAËS, 2015) Para Kaës, a pesquisa sobre realidade psíquica o leva a concluir que o pulsional e a intersubjetividade estabelecem relações de correlação e de co-construção havendo, portanto, uma dupla ancoragem da realidade psíquica.
Nos estudos sobre a metapsicologia do terceiro tipo, as alianças inconscientes são pensadas como expressão da realidade psíquica e, esse debate exige reconhecer que a heterogeneidade dos espaços psíquicos, intrapsíquicos, intersubjetivos e grupais, não são redutíveis um ao outro; e, teremos como tarefa pensar quais são as suas articulações- mediações. Nessa articulação, uma força decisiva é reconhecer o fantasma em sua dimensão estrutural e distributiva e, reconhecer o duplo eixo estruturante da posição do sujeito e da organização do grupo: o eixo da aliança horizontal com o mesmo, sustentada pelas identificações mútuas à imagem do semelhante e o eixo da filiação e das afiliações, que inscreve o sujeito singular e os grupos na sucessão de movimentos de vida e morte entre as gerações. Além disso, deve-se considerar a resistência que opõe, a toda redução imaginária, a opacidade do outro ou dos outros: a consistência da realidade psíquica que envolve os sujeitos no afastamento uns dos outros. É precisamente esse afastamento que as ligações imaginárias do grupo visam abolir. A análise deveria incidir exatamente no afastamento. (KAËS, 1994). Os argumentos para outro modelo clínico se anunciam.
Alianças Inconscientes e Aparelho Psíquico Grupal: algumas noções
A ligação e o agenciamento das formações e dos processos psíquicos entre os sujeitos se efetuam necessariamente para serem mantidos ou transformados os vínculos intersubjetivos no grupo, como conjunto. Esse trabalho psíquico de ligação e dissociação, esse processo de transformação, é alcançado por meio da construção comum de um aparelho psíquico de agrupamento. As formações da grupalidade psíquica funcionam como organizadores deste aparelho (KAËS,1994).
A noção de contrato narcísico (Piera Aulagnier) surge para sublinhar que o sujeito vem ao mundo da sociedade e da sucessão de gerações sendo portador de uma missão: ter que assegurar a continuidade da geração e do conjunto social. O contrato, por meio do grupo, atribui e oferece um lugar a cada um e esse lugar é significado pelo conjunto de vozes que o antecederam
Dessa forma, a reflexão sobre realidade psíquica nos grupos, famílias e instituições implica questionar os seus limites. Pode-se admitir que a realidade psíquica consiste, de um lado, nos efeitos dos desejos inconscientes dos membros do grupo, que ela conserva para a estrutura, conteúdos e funcionamentos próprios a cada um dos sujeitos. Contudo, devemos investigar a maneira como ela se manifesta, quais os conteúdos eletivamente mobilizados, que transformações são exigidas e que efeitos ela produz ao se ligar a formações idênticas, homólogas ou antagonistas, nos outros sujeitos do grupo.
As hipóteses designam, portanto, uma região da realidade psíquica que não adquire seu valor e sua consistência a não ser pelo fato de estar ligada ao agrupamento dos sujeitos que o constituem: ela subsiste fora de sua singularidade e acentua o debate sobre a articulação do intrapsíquico, do intersubjetivo e do grupal. “A realidade psíquica do nível do grupo se apoia e se modela sobre as estruturas da realidade psíquica individual notadamente sobre as formações da grupalidade intrapsíquica; estas são transformadas, agenciadas e reorganizadas segundo a lógica do conjunto” (KÄES, 1993, p.86). Portanto, o grupo impõe uma exigência de trabalho psíquico, comandado pela sua organização, sua manutenção e sua lógica própria. Admitir que a realidade psíquica não se reduz à somatória da realidade psíquica de cada membro do grupo implica admitir que os investimentos e as representações de cada um se ligam e se metabolizam em formações e em processos psíquicos originais. (KÄES, 1993; 2005;2009;2015)
Tipos de Alianças Inconscientes: pactos e contratos
Kaës diferencia e descreve quatro tipos de Alianças Inconscientes: as estruturantes, as defensivas ou pactos denegativos, as alienantes, patogênicas e patológicas e as ofensivas (KAËS, 2009; 2015) As alianças estruturantes (primárias e secundárias) reagrupam aquelas cujos efeitos são estruturantes para os sujeitos dessas alianças e para os vínculos que tecem entre eles como, por exemplo, as fundadas sobre os interditos fundamentais ou o contrato narcísico. As alianças defensivas formam um segundo conjunto constituído pelos pactos denegativos. Sua finalidade é essencialmente defensiva. Como derivação destas, descreve as alianças alienantes e patogênicas que formam um terceiro conjunto de alianças, tais como os pactos perversos e os pactos narcísicos. O quarto grupo de alianças descreve as alianças ofensivas: elas selam o acordo de um grupo para “conduzir um ataque, realizar um projeto ou exercer uma supremacia” (KAËS, 2015, p. 201).
As pesquisas sobre as alianças inconscientes são contemporâneas das desenvolvidas em 1980, sobre a posição ideológica, expressas no livro L’Ideologie. Études Psychanalytiques. Nessa época, estudava as modalidades de agenciamento e as exigências requeridas à sua manutenção, numa abordagem psicanalítica, motivado pelas mudanças profundas que tinham abalado a França e grande parte do mundo ocidental, nos idos de 1968. Observava que, no sujeito singular, a posição ideológica se construía sobre certas bases da psique infantil e das teorias que ela desenvolve para tratar questões enigmáticas sobre a origem, o nascimento e a diferença de sexos (KAËS, 2016). A ideia todo poderosa, a influência do ídolo e as exigências de um narcisismo arcaico do ideal, predominavam. Indo além, estabelecia, nesse período, a proposição de que não era possível ser crente sozinho – a crença precisa ser sustentada por outro ou, mais de um outro; requisito fundamental. E, acentuava, ainda, a ligação que a ideologia mantém com o fantasma da imortalidade: a ideologia (…) desenvolve um discurso suficientemente universal para que ele resista à representação das diferenças (…) (KAËS, 1993, p. 266). Os efeitos dessa posição ideológica e as alienações por ela geradas, nas suas formas radicais, manifestam-se até hoje, por exemplo referente aos temas da purificação étnica.
Mais recentemente, em torno dos anos 2000, a pesquisa sobre as alianças inconscientes desenvolveu-se junto aos estudos sobre os processos associativos nos grupos. Essas duas orientações de pesquisa mostram que para se associar a um grupo não basta aos sujeitos identificarem-se a um objeto comum entre si, mas, ainda devem selar um acordo inconsciente, segundo o qual, para manter seu vínculo e o grupo que o contém, não se trataria de determinado número de coisas; elas devem ser recalcadas, arquivadas, abolidas ou apagadas (KAËS, 1993;2009; 2015).
As Alianças Inconscientes, tópicas do inconsciente, reúnem sob essa denominação os acordos inconscientes estabelecidos entre vários sujeitos. Os pactos narcísicos, os pactos denegativos, as alianças denegadoras, a comunidade de negação, o contrato narcísico (Aulagnier, 1979), são manifestações dessas alianças. Elas têm uma tópica e se situam nos pontos de enlace das relações recalcadas que sustentam os sujeitos singulares e os conjuntos, dos quais eles são a parte constituída e a parte constituinte.
“Elas se formam nessa conjunção que não é a do coletivo, mas da intersubjetividade. As alianças inconscientes são formações de uma aparelhagem psíquica dos sujeitos de um conjunto intersubjetivo: casal, grupo, família, instituição. Elas determinam as modalidades de vínculo entre os sujeitos e o espaço psíquico do conjunto através deles”.
(KAËS, 1993, p. 278).
As noções de contratos, de pactos e de leis estão no âmago da intersubjetividade e da sociabilidade. A lei transcende as alianças e se impõe como garantia da ordem humana, a estruturar as relações de desejo e de interdição entre os sujeitos. Para a psicanálise, contudo, a noção de contratos, pactos e alianças é constituída sobre outra base. Não se refere à salvaguarda dos direitos individuais, mas às condições constitutivas do sujeito do inconsciente (KAËS, 1993; 2009; 2015)
A noção de contrato narcísico (Piera Aulagnier) surge para sublinhar que o sujeito vem ao mundo da sociedade e da sucessão de gerações sendo portador de uma missão: ter que assegurar a continuidade da geração e do conjunto social. O contrato, por meio do grupo, atribui e oferece um lugar a cada um e esse lugar é significado pelo conjunto de vozes que o antecederam, conforme o discurso do mito fundador do grupo. O contrato designa o que está no fundamento da relação entre sujeito/sociedade, indivíduo/conjunto, discurso singular /referência cultural. O pacto narcísico, como o entende Kaës, é o resultado de uma paz imposta, diferentemente do contrato. O pacto narcísico contém e transmite a violência: “o pacto narcísico designaria assim uma atribuição unívoca ou mútua a uma localização de perfeita coincidência narcísica; esta localização não suportaria qualquer afastamento (…)” (KAËS, 1993, p.274; 2009)
O pacto denegativo aparece como a contraface e o complemento do contrato narcísico. Kaës introduz essa noção (em 1985) tendo como finalidade descrever a tópica do vínculo intersubjetivo. “De início propus o conceito para designar vários tipos de mecanismos de defesa e diversas modalidades da emergência do negativo nos vínculos de grupo” (KAËS, 2009, p.113). Ele apresenta duas polaridades: uma é organizadora do vínculo e do conjunto, a outra é defensiva. De fato, cada conjunto particular organiza-se positivamente sobre investimentos mútuos, sobre identificações comuns, sobre uma comunidade de ideais e crenças, sobre um contrato narcísico, sobre modalidades toleráveis de realizações de desejos (…); cada conjunto organiza-se também negativamente sobre uma comunidade de renúncias e de sacrifícios, sobre extinções, rejeições e recalques, sobre um deixar de lado e sobre restos” (KAËS, 1993, p. 274). O pacto, de maneira geral, é resultado do trabalho de produção do inconsciente necessário à formação e à manutenção do vínculo intersubjetivo.( KAËS, 2009)
A aliança Inconsciente é pensada, dessa forma, como formação psíquica intersubjetiva construída pelos sujeitos de um vínculo para reforçar, em cada um deles, certos processos, certas funções ou certas estruturas das quais eles se beneficiam tal que, a ligação que os mantêm junto, toma para a vida psíquica um valor decisivo (Kaës, 1993). “O conjunto assim ligado não tem sua realidade psíquica a não ser pelas alianças, contratos e pactos que os sujeitos estabelecem e que o seu lugar no conjunto os obriga a manter. Uma aliança inconsciente implica, assim, a ideia de obrigação e a ideia de sujeição” (KAËS, 1993, p.278). Dessa forma, elas estão a serviço de uma função recalcadora/recalcante e constituem, também, medidas de um sobre-recalque, uma espécie de duplicação do recalque, à medida que se manifestam não somente sobre os conteúdos inconscientes, mas sobre a própria aliança. (FERNANDES, 2005, p.129)
Conforme afirma o autor, a partir do momento em que os dispositivos psicanalíticos se ampliaram a situações plurisubjetivas como o grupo, a família, o casal e as instituições, os espaços psíquicos neles mobilizados são de realidades específicas, comuns e partilhadas entre os sujeitos. O modelo do aparelho psíquico grupal busca a inteligibilidade desses três espaços de realidade psíquica inconsciente que dispõem de conteúdos psíquicos, organizações e funcionamento específicos com uma tópica, uma economia e uma dinâmica distintas. São relações complexas que articulam, distinguem e opõem o espaço do sujeito singular dos espaços plurais intersubjetivos e transubjetivos. Desse processo de aparelhagem resultam formações comuns aos membros do grupo e ao conjunto que eles formam, mas também processos e formações que fazem fronteira e vínculo entre esses espaços (KAËS, 2015).
Aí está a originalidade do pensamento do autor. Dele resulta a questão a respeito de qual escuta se constitui nos diversos dispositivos. Certamente a escolha do psicanalista se definirá sobre várias dimensões: clínica, metodológica e epistemológica. Embora cumpra-se como função constante, qualquer que seja o dispositivo em ação, ao aceitar o adiamento da resposta, colocar em espera o pedido e dar a resposta em outro nível, em relação ao qual se é diretamente solicitado, lida-se com espaços múltiplos, com outras configurações do campo transferencial-contratransferencial e o trabalho de interpretação difere do trabalho realizado no dispositivo clássico. O objetivo primeiro do trabalho psicanalítico, contudo, é a recriação pelo sujeito do espaço psíquico “no qual sua capacidade de amar, de brincar e de trabalhar é libertada de sua autoalienação e de sua alienação ao outro e a mais de um outro” (KAËS, 2015, p. 156).
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